Decorre entre os dias 21 e 26 de Abril de 2025, no Posto Administrativo de Ponta D´Ouro, Distrito de Matutuíne, Província de Maputo, o Seminário Nacional de Balanço em matéria de Ilícitos e Contencioso Eleitorais, sob o lema “o Papel do Judiciário na Administração da Justiça Eleitoral, consolidando o Estado de Direito Democrático: Balanço e Perspectivas”.
Participam no evento, Juízes Conselheiros do Tribunal Supremo, Procuradores-Gerais Adjuntos, Juízes Desembargadores, Sub-Procuradores, Magistrados Judiciais e do Ministério Público, Inspectores do Serviço Nacional de Investigação Criminal, Representante do PNUD, entre outros convidados.

A realização do seminário, tem por objectivo geral, avaliar o nível do alcance dos resultados esperados com as acções de capacitação realizadas no ano passado no âmbito da preparação do Judiciário para as Eleições Gerais de 2024, do Presidente da República, Deputados da Assembleia da República e das Assembleias Provinciais e Governadores de Província.
São objetivos específicos do seminário: (i) avaliar e analisar as dificuldades encontradas na averiguação, tramitação e decisão de processos de ilícios e contencioso eleitorais; (ii) promover a troca de experiências adquiridas durante o processo eleitoral; (iii) avaliar o nível de harmonia na actuação, interpretação e aplicação das leis eleitorais entre actores e órgãos envolvidos; (iv) aferir a funcionalidade das capacitações para os desafios encontrados; (v) colher a sensibilidade dos beneficiários sobre a influência da capacitação no nível da sua aptidão para a solução dos casos; e (v) propor recomendações para futuras acções de capacitação na matéria.
Há que recordar que no âmbito da preparação da intervenção do Judiciário nas eleições de 09 de Outubro de 2024, foram realizados 11 seminários, em todas as capitais provinciais, incluindo a Cidade de Maputo, que beneficiaram um total de 600 actores do Judiciário, dentre Magistrados Judiciais e do Ministério Público e Inspectores do SERNIC.
No cerne das matérias tratadas durante a formação, destacam-se, entre outros, o quadro jurídico-legal e os princípios fundamentais que regem os processos eleitorais; órgãos e instituições que participam da administração eleitoral e, bem assim, da resolução de conflitos eleitorais, designadamente CNE, PGR, Tribunais Judiciais e Conselho Constitucional; actos eleitorais; recurso contencioso eleitoral; e Ilícitos eleitorais; visando a interpretação uniforme da legislação eleitoral na resolução de ilícitos e contenciosos eleitorais emergentes antes, no decurso e no período posterior aos pleitos eleitorais.
O Juiz Conselheiro do Tribunal Supremo, Luís António Mondlane, Coordenador dos seminários, no discurso de abertura, referiu que o seminário se destina, justamente, a fazer uma avaliação criteriosa da qualidade, utilidade e eficácia das aludidas formações e, por essa via, da prestação do judiciário e dos demais órgãos que participam da administração da justiça eleitoral.
O Coordenador dos seminários, considerou, no discurso da abertura que, “sem desprimor para os demais órgãos e instituições acima referidas, a intervenção do judiciário nas últimas eleições demonstrou inequivocamente uma qualidade cada vez mais elevada, sinal claro de que trilhamos um bom caminho, factor que a todos motiva o prosseguimento”.
O Juiz Conselheiro, anotou, todavia, que “o período pós votação foi marcado por tensões politicas, manifestações com violência sem precedentes na história do exercício democrático no país”.
Desafiou, Luís António Mondlane ainda, que “a vandalização e destruição de empreendimentos públicos e privados, com especial realce para edifícios dos tribunais, postos de saúde, instalações policiais e outros acentuam a necessidade de uma rápida identificação das causas (directas ou indirectas, imediatas ou recuadas no tempo e no espaço) com vista a identificar as devidas soluções”.
Apontou, no discurso, o Juiz Conselheiro do Tribunal Supremo, que “tem-se amiúde apontado a necessidade de se prover o país de um sistema eleitoral que reduza ao máximo a ocorrência de dissensos, desconfianças na origem de conflitos eleitorais; estudiosos da matéria têm apontado a necessidade de codificação da lei eleitoral por forma a evitar discrepâncias, redundâncias e, igualmente evitar alterações legislativas já no decurso do processo eleitoral”.
O Juiz Conselheiro, referiu, que um dos exemplos paradigmáticos da instabilidade da legislação eleitoral é ilustrado pelo princípio da impugnação prévia, a um tempo positivado para logo a seguir ser retirado do quadro legal. Mas, o espaço para o aprimoramento do sistema eleitoral não se limita ao foro legal. Avançando com o discurso, o Juiz Conselheiro do Tribunal Supremo, destacou que desde o ano de 1994, dando prosseguimento ao plasmado na Constituição de 1990 que introduziu o sistema de democracia plural, tem-se registado eleições periódicas no quadro do sistema então criado que, ao que tudo indica, necessita de reforma imediata.
Desafiou que com base na experiência recente, espera-se que deste seminário sejam identificadas as questões que requerem atenção imediata (Constatações) e as propostas de solução (Recomendações) destinadas ao aperfeiçoamento do sistema eleitoral.
Assinalou, o Juiz Conselheiro Luís António Mondlane, que, sem a pretensão de trazer soluções acabadas, pode-se afirmar que, no geral, o processo eleitoral não pode continuar assente em campanhas ou soluções administrativas ad hoc. Para tanto, é necessário assegurar a presença do Estado em cada parcela do território nacional, facto que, compreensivelmente, não se opera num só dia. Isso permitiria uma atualização permanente com a possibilidade de, a qualquer tempo, se poder determinar quem e quantos são os cidadãos com capacidade eleitoral (activa ou passiva).
Para o Juiz Conselheiro, “torna-se imperiosa a redução da carga burocrática, por que excessiva, que alonga a distância entre o momento da votação e o do conhecimento do resultado. Quanto mais tempo se leva, mais se fermenta a impaciência, fervilha a desconfiança sobre os resultados que vierem a ser proclamados, isto por um lado”.
O Juiz Conselheiro Luís Mondlane, considerou que, no que respeita ao sistema de justiça eleitoral, a opção adoptada no ordenamento jurídico nacional estabelece um sistema híbrido, a lei garante expressamente o duplo grau de jurisdição em matéria eleitoral. Suscitada a questão de irregularidade ou mesmo nulidade de actos eleitorais, o tribunal judicial de distrito não tem alternativa senão decidir o caso concreto, extraindo-se daí as respetivas consequências. Em sede de recurso, as decisões dos tribunais de 1ª instância podem ser mantidas, alteradas ou revogadas. Os direitos e interesses dos cidadãos, agentes eleitorais, mandatários ou delegados de partidos e demais agentes estarão plenamente protegidos, salvaguardando-se a paz, a lisura e a transparência do processo eleitoral. Assim, estarão acautelados os princípios da celeridade, economia processual e do devido processo.
O Juiz Conselheiro assinalou que o tratamento criterioso dos diferendos que eventualmente surjam nos pleitos eleitorais, com disciplina, competência e diligência que têm caracterizado a actividade jurisdicional, contribuirá significativamente para o desenvolvimento do Direito Eleitoral.
Destacou, ainda, no discurso, que “a dedicação e zelo, competência e diligência com que dispensaram a justiça eleitoral constituem motivo de orgulho das magistraturas, oficiais de justiça e Inspectores do SERNIC e de todos quantos participaram na administração da justiça eleitoral. É motivo de orgulho para o judiciário, o país e para os moçambicanos”.
Por seu turno, o Presidente da Comissão Nacional de Eleições, Carlos Matsinhe, referiu, na intervenção, que há que assinalar o papel crucial dos seminários de formação realizados, desde organização e preparação dos formadores provinciais, que, por sua vez, afinaram a máquina da justiça eleitoral a todos os níveis.
O Presidente da Comissão Nacional de Eleições, assinalou que deste ciclo eleitoral, com os diversos desafios encarados, tanto antes do dia 09 de Outubro de 2024, bem como durante as manifestações pós-eleitorais violentas e de forma inequívoca, aprendemos que o nosso quadro legal eleitoral deve, constantemente, ter a sensibilidade social e deve haver diálogo entre as instituições de direito e acções coordenadas da sua aplicação para além da necessidade de difundir permanentemente estas leis e outras de carácter vital para a paz e tranquilidade deste país.
O Presidente da Comissão Nacional de Eleições, anotou que “as experiências vividas neste ciclo eleitoral devem ser vistas como lições valiosas para o futuro; precisamos de continuar a contribuir na construção de pontes entre as instituições, os cidadãos e os partidos políticos e os demais diversos sectores da sociedade através da justiça eleitoral em particular; de mais escuta e comunicação para que a legislação eleitoral seja repensada para preencher todas as lacunas que possam abrir espaço à perpetuação da desconfiança e descrédito em cada ciclo eleitoral”.
Carlos Matsinhe anotou que “sabemos que uma democracia sólida e genuína não se impõe, constrói-se, passo a passo, com verdade, observância dos ditames da Lei, com justiça e com a participação activa de todos”.
O Seminário Nacional em Matérias de Ilícitos e Contencioso Eleitorais é co-organizado pelo Tribunal Supremo e a Procuradoria-Geral da República, e conta com o apoio de parceiros estratégicos de cooperação, designadamente, a Embaixada do Reino da Noruega, o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD).